ARMADILHAS DA HOMOLOGAÇÃO SEM O SINDICATO

A regra é clara (diz o bordão repetido por um ex-árbitro de futebol), e o Dicionário Aurélio não deixa dúvidas sobre o significado do verbo homologar: “aprovar, confirmar por autoridade judicial ou administrativa; reconhecer oficialmente, reconhecer como legítimo.” Ao revogar dois parágrafos do artigo 477 da CLT, que estabeleciam que o acerto de contas entre patrão e empregado devia ser feito no sindicato da categoria, a reforma trabalhista extinguiu na prática a homologação, pois não há mais uma autoridade administrativa (como o sindicato) que aprove e confirme os valores da rescisão. Agora, ela é feita na empresa diretamente, o que apavora o funcionário. Sem a assistência sindical, ele não tem como saber se foi ou não ludibriado. A questão, porém, é ainda mais grave do que parece. Quando a reforma trabalhista entrou em vigor, em novembro passado, muitas empresas – as honestas e as nem tanto – festejaram o fim da chamada homologação no sindicato da categoria, que conferia na ponta do lápis se a firma estava de fato pagando tudo que era direito do colaborador desligado. Afinal, era uma amolação burocrática e custosa ter de deslocar alguém do RH para fazer o acerto de contas no sindicato. A vantagem, no entanto, não era só do trabalhador. A homologação era boa para as duas partes porque colocava uma pedra em cima de verbas e valores. Ela tinha algo, sacramentado na súmula 330 do TST, chamado, em termos jurídicos, de eficácia liberatória. Trocando em miúdos, não era possível reclamar na Justiça depois. Ao eliminar a homologação da CLT, a reforma traba-lhista permite agora que o empregado entre na Justiça depois para contestar valores, o que pode sair mais caro para o empregador. “A desburocratização pretendida pelas empresas causou mais insegurança jurídica do que ensejava o artigo 477 e seus dois parágrafos da CLT, além de permitir no Judiciário ações anulatórias de rescisões, em que o empregado alegue ter sofrido coação ou ter sido induzido a erro, entre outras”, afirma Francisco Gérson Marques de Lima, professor de direito na Universidade Federal do Ceará e procurador regional do trabalho. Em entrevista exclusiva à revista Mundo Sindical (a seguir), ele explica as diversas polêmicas criadas pela nova legislação e também propõe saídas. A sindicalização, para ele, é a mais importante.

TRABALHADOR É O PRIMEIRO E MAIS PREJUDICADO

Mundo Sindical – Quando se fala em homologação após a reforma, o que se ouve sempre é o prejuízo aos trabalhadores, que podem ser facilmente enganados. O senhor, no entanto, afirma em artigo que as empresas também podem sair perdendo. Qual dos dois pratos dessa balança, afinal, é o mais afetado pela nova legislação? Francisco Gérson Marques de Lima – O trabalhador é o primeiro e mais prejudicado pela nova sistemática da rescisão contratual, que alija o sindicato de uma de suas atribuições históricas e põe o trabalhador à mercê dos RHs. Todavia, segundo estabelece a legislação civil, os atos cometidos sob lesão, erro, coação ou ignorância podem ser anulados judicialmente. A renúncia a direitos irrenunciáveis não tem validade alguma. Logo, se o empregado der quitação na rescisão, mas, depois, perceber que foi levado a erro, ou a deu sob ignorância, ou que o ato gerou renúncia a direitos, poderá tornar a quitação sem efeito e anulá-la. A falta de conhecimento do trabalhador e a renúncia, por exemplo, não são difíceis de ser provadas. A insegurança que a reforma traba-lhista trouxe às empresas, neste particular, dependerá da atuação dos sindicatos e de seus advogados, a quem cabe combater as ilicitudes imediatas, cometidas contra os trabalhadores. Se não houver nenhuma ação judicial nem questionamento sobre a conduta das empresas, logicamente os direitos vilipendiados e a forma como tenha ocorrido a rescisão contratual continuarão válidos, pois as ações judiciais são os meios próprios de se anularem atos jurídicos. As fragilidades da nova modelagem de rescisão contratual precisam ser expostas. A eficácia liberatória na rescisão contratual caiu, porque sua razão de ser era a presença do sindicato ou de autoridades públicas nesse ato. Permaneceu a quitação simples do Código Civil, sendo, portanto, questionável, revogável, retratável. 

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