Representação sindical e as contribuições dos integrantes da categoria

Fonte: Comentário jurídico
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17 de março de 2017
Por Pedro Paulo Teixeira Manus

A estrutura sindical brasileira tem seu fundamento no artigo 8º da Constituição Federal e nos artigos 511 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho e seguintes, que compõem seu Título V.

Optou o legislador brasileiro, quando da edição da Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943, pelo modelo de unicidade sindical, que significa a limitação à existência de apenas um sindicato por categoria econômica ou profissional em uma dada base territorial, que tem o monopólio da representação de toda a categoria.

E o legislador constitucional de 1988 manteve esta estrutura, no artigo 8º do texto, que em seu inciso II afirma: “é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município. ”

Criou-se assim uma entidade originariamente de direito privado, mas que tem além do monopólio da representação de toda a categoria, goza da prerrogativa de impor contribuição a todos estes integrantes, consubstanciada no antigo “imposto sindical”, que atualmente denomina-se contribuição sindical, e regulada pelos artigos 578 e seguintes da Consolidação das Leis do Trabalho.

Não obstante o considerável valor arrecadado com a contribuição sindical, esta receita apenas não é suficiente para fazer frente a todos os encargos que têm as entidades sindicais. Por este motivo, além da mensalidade cobrada dos associados, instituem as convenções coletivas de trabalho contribuições outras a serem arrecadadas dos integrantes da categoria, como a contribuição confederativa e a contribuição assistencial, que afinal compõem a receita sindical.

A questão é saber se os empregados que não são sócios do sindicato e, portanto, não participam da assembleia que autoriza a negociação coletiva que culmina com a celebração da convenção coletiva de trabalho, mas que por ele são representados e afinal se beneficiam das vantagens asseguradas por esta norma coletiva, estão obrigados a sofrer os descontos destas contribuições.

Como afirma o sítio do Tribunal Superior do Trabalho de 07 de março de 2017:

“O Supremo Tribunal Federal confirmou a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho que veda o desconto da contribuição assistencial de trabalhadores não filiados ao sindicato. A decisão foi tomada no Recurso Extraordinário com Agravo (ARE 1018459), interposto contra decisão da Justiça do Trabalho que, em ação civil pública, determinou que o Sindicato dos Metalúrgicos de Curitiba (PR) se abstivesse de instituir, em acordos ou convenções coletivas, contribuições obrigando trabalhadores não sindicalizados, fixando multa em caso de descumprimento.

O entendimento, adotado em recurso com repercussão geral reconhecida, deve ser aplicado a todos os demais processos que tratem da mesma matéria. Também em função da decisão, os recursos extraordinários que se encontravam sobrestados no TST à espera da definição do chamado leading case pelo STF terão sua tramitação retomada.

De acordo com o Precedente Normativo 119 da Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do TST, cláusulas de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa que estabeleçam contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie para trabalhadores não sindicalizados são ofensivas à liberdade de associação e sindicalização (artigos 5º, inciso XX e 8º, inciso V, da Constituição da República. Assim, os valores descontados irregularmente são passíveis de devolução.

O relator do recurso no STF, ministro Gilmar Mendes, explicou que a questão está pacificada pela jurisprudência do STF no sentido de que somente a contribuição sindical prevista especificamente na CLT, por ter caráter tributário, pode ser descontada de toda a categoria, independentemente de filiação. Assim, considerou equivocada a argumentação do sindicato de que o exercício de atividade ou profissão, por si só, já torna obrigatória a contribuição, independentemente da vontade pessoal do empregador ou do empregado. “O princípio da liberdade de associação está previsto no ordenamento jurídico brasileiro desde a Constituição de 1891, e a liberdade de contribuição é mero corolário lógico do direito de associar-se ou não”, concluiu.

Temos assim definida a questão relativa à obrigatoriedade da contribuição dos empregados não associados ao sindicato, que devem sofrer somente o desconto da contribuição sindical, que tem fundamento legal.

Todavia, embora só contribuam com uma parcela do valor arrecadado pelo sindicato, beneficiam-se de todas as garantias asseguradas pela norma coletiva, o que cria uma situação inusitada de benefício sem contrapartida.

Trata-se de um dentre os vários problemas que decorrem do princípio da unicidade sindical, na medida em que o sindicato representa quem não é sócio e não tem poderes para fiscalizar e cobrar a atuação do sindicato.

Em sentido oposto à unicidade sindical temos o princípio da pluralidade sindical, consagrado pela Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho, que cuida da liberdade e autonomia sindical, e que o Brasil não ratificou.

Caso houvesse a ratificação da convenção este fato ocasionaria a revogação tanto do artigo 8º da Constituição Federal quanto do Título V da Consolidação das Leis do Trabalho.

Eis a importância do tema, pois a mudança da estrutura sindical brasileira, que seria obrigatória consequência da ratificação da Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho, acarretaria profunda alteração no processo de representação e de financiamento das entidades sindicais, com sérias repercussões no mundo sindical e trabalhista, com o engessamento principalmente das maiores entidades sindicais, já que a estrutura funda-se na cobrança da contribuição sindical e das demais contribuições de todos os integrantes da categoria.

Não temos dúvidas que um sindicato só de associados tem maior fidelidade na representação do grupo de representados, mas à evidência tratar-se-ia de uma entidade com número expressivamente menor de representados, diminuindo seu poder de negociação.

Não acreditamos atualmente que a ratificação da Convenção 87 seja o caminho a ser seguido pelo sindicalismo brasileiro, por todas as implicações que este fato acarretaria, mormente a resistência interna e externa à modificação, reclamando uma alternativa adequada à nossa realidade, mas estamos convictos de que se faz necessária a mudança do critério de representação, a fim de que as entidades tenham maior identificação com suas bases.

Qual o caminho a seguir e o modelo a ser adotado é tarefa que exige muita reflexão e cuja decisão deverá ser objeto de deliberação principalmente dos próprios interessados, que têm conhecimento teórico e prático do tema da representação sindical, elementos fundamentais para o êxito da mudança.

Pedro Paulo Teixeira Manus é ministro aposentado do Tribunal Superior do Trabalho, professor e diretor da Faculdade de Direito da PUC-SP.

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