LEIS TRABALHISTAS - HIERARQUIA E CUIDADOS NA APLICAÇÃO

A legislação trabalhista é composta por uma infinidade de normas que geram inúmeras dúvidas quanto à sua prioridade hierárquica na aplicação nas relações de trabalho e emprego.

A principal e mais conhecida norma do Direito do Trabalho é sem dúvida a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto 5.452/43, na qual se encontra normatizada a maior parte da legislação das relações trabalhistas.

No entanto, desde àquela época, as relações de trabalho vem sofrendo inúmeras mudanças e adaptações às necessidades de mercado, à globalização e à flexibilização do trabalho, o que gerou, paralelamente, inúmeras medidas de adaptações legislativas que pudessem atender à estas mudanças.

Considerando todas estas alterações, ainda não são raras as situações em que encontramos as chamadas "lacunas na lei", ou seja, situações de conflitos originados das relações do trabalho e que não estão previstas na legislação, o que provoca a necessidade de o Judiciário, por meio da jurisprudência, preencher estas lacunas através de suas súmulas (entendimentos dos respectivos Tribunais), vinculantes ou não.

Além da CLT há várias outras fontes legislativas que regem o Direito do Trabalho, sejam elas gerais, como a Constituição Federal do Brasil, sejam elas específicas, como a lei do empregado doméstico,  a lei do FGTS, a lei dos advogados, os acordos e convenções coletivas de trabalho dentre outras.

As empresas e os profissionais de Recursos Humanos devem estar atentos às mais diversas fontes legislativas para que, dependendo do caso concreto, seja aplicada a norma mais adequada àquela situação.

Não obstante, no Direito do Trabalho há ainda princípios que podem simplesmente sobrepor a qualquer norma legislativa, seja ela geral ou específica, como é o caso, por exemplo, do princípio da primazia da realidade, pelo qual a verdade dos fatos impera sobre qualquer contrato formal, por mais bem escrito que esteja.

Para o Direito do Trabalho vale o que realmente acontece. O documento possui validade desde que reflita a realidade.

PRINCIPAIS NORMAS TRABALHISTAS

As leis trabalhistas que regulam o Direito do Trabalho podem se originar basicamente das seguintes fontes principais:

 Leis ou normas estabelecidas pelo Estado Brasileiro
  • Constituição Federal (CF/88);
  • Consolidação das Leis do Trabalho (CLT);
  • Leis específicas (como as citadas anteriormente);
  • Decretos e Decretos-Lei;
  • Medidas Provisórias;
  • Portarias Ministeriais;
  • Resoluções;
  • Normas Regulamentadoras (NR´s);
  • Instruções Normativas entre outras.
Leis ou normas estabelecidas entre as partes
  • Acordo Coletivo de Trabalho (ACT);
  • Convenção Coletiva de Trabalho (CCT);
  • Contratos Individuais.
Origem mista (Estado e as partes)
  • Dissídio Coletivo - nesta situação a origem é a negociação coletiva (que restou frustrada) e por conta da ação judicial, o TRT ou o TST, por meio da sentença normativa, estabelece a norma que vai valer entre as partes.
Normas Internacionais

PRINCÍPIOS DO DIREITO DO TRABALHO

Além das leis trabalhistas citadas no subitem anterior, o Direito do Trabalho é regido também e principalmente, de alguns princípios que norteiam as relações do trabalho.

O Direito do Trabalho, através das leis trabalhistas e da aplicação destes princípios, busca garantir um equilíbrio entre o hiper (empregador) e o hipossuficiente (empregado), já que o hipossuficiente se apresenta mais vulnerável numa relação de trabalho, frente ao poder econômico e diretivo do empregador.

Princípio da Primazia da Realidade

O princípio da primazia da realidade destaca justamente que o que vale é o que acontece realmente e não o que está escrito. Neste princípio a verdade dos fatos impera sobre qualquer contrato formal, ou seja, caso haja conflito entre o que está escrito e o que ocorre de fato, prevalece o que ocorre de fato.

Portanto, por mais que a empresa estabeleça em contrato que a jornada de trabalho é de 8 horas diárias, mas o empregado exercia, de fato, 9 ou 10 horas, ainda que no espelho do ponto estejam registradas as 8 horas, o empregador poderá ser condenado a pagar 1 ou 2 horas extras, respectivamente, se comprovado que de fato o empregado realizava as horas extraordinárias.

Assim, ainda que a empresa estabeleça cláusulas de atividades "A´s" no contrato, se for comprovado através dos fatos que o empregado exercia atividades "B´s", a empresa estará obrigada a pagar as "B´s".

Destarte, nada irá adiantar o empregador se cercar de provas documentais exigidas por lei se os fatos não confirmam esta "verdade" representada pelos documentos, já que a verdade dos fatos, para a Justiça do Trabalho, é maior que a verdade dos documentos.

Princípio da Proteção do Trabalhador

Este princípio envolve três regras, a saber:

a) In dubio pro mísero: o "in dubio pro misero" ou "in dubio pro operario" é um princípio voltado mais para o julgador (juiz) que, na dúvida diante de dois ou mais sentidos que uma norma pode possuir, julga em favor do empregado.

b) Condição mais favorável: esta regra aplicada ao princípio de proteção ao trabalhador pressupõe que as vantagens já adquiridas pelo empregado não podem ser mais retiradas, ou seja, uma nova norma não pode reduzir condição mais favorável já existente. É a expressão do direito adquirido.

c) Norma mais benéfica: no caso de conflito de leis, ou seja, quando houver leis federais, leis específicas e até acordos e convenções coletivas que regem sobre a mesma matéria, aplica-se aquela que for mais benéfica ao empregado.

Princípio da Isonomia Salarial

O art. 461 da CLT dispõe sobre o princípio da isonomia salarial, onde os trabalhos iguais merecem remunerações iguais, ou seja, os empregados que executam a mesma função, com a mesma perfeição técnica e produtividade aos seus colegas de trabalho, tem direito a equiparação salarial.

Portanto, não basta que o empregador simplesmente estabeleça cargos nominalmente diferentes, ou seja, não será suficiente ter cargos descritos no contrato de trabalho de forma distinta, é preciso que as funções e as responsabilidades exercidas pelos empregados sejam distintas para se evitar a equiparação salarial.

HIERARQUIA - QUE LEGISLAÇÃO APLICAR PRIMEIRO

Como já discorrido anteriormente, no Direito do Trabalho a aplicação da legislação não é igual ao que vemos no Direito Civil, Penal, Administrativo e etc. Há peculiaridades na legislação trabalhista que nos remetem a avaliação do caso concreto para só então definirmos a legislação a ser aplicada.

Cabe ao administrador e ao profissional de Recursos Humanos conhecerem com profundidade as peculiaridades trabalhistas em relação à atividade da empresa, conhecer leis específicas que possam disciplinar certas atividades profissionais, observar os acordos e convenções coletivas que possam abranger situações mais benéficas ao empregado.

Portanto não é possível estabelecer uma hierarquia fixa na legislação trabalhista já que uma legislação inferior poderá imperar sobre uma legislação superior, se aquela norma for comprovadamente mais benéfica ao empregado.

Exemplo

Convenção coletiva de trabalho estabelece que o percentual de horas extras extraordinárias devam ser remuneradas com 70% (setenta por cento) durante a semana e 120% (cento e vinte por cento) nos finais de semana.

Embora se saiba que a Lei Maior é a Constituição Federal e que esta estabelece que a remuneração do serviço extraordinário seja de, no mínimo, cinquenta por cento, a convenção coletiva, como a própria CF estabelece, faz lei entre as partes e por ser mais benéfica ao empregado, prevalece o estabelecido na convenção.
 
Aqui se verifica a aplicação de um dos princípios já citado anteriormente que é a aplicação da norma mais benéfica ou mais favorável.

DICAS PARA NÃO INCORRER EM ERROS - CUIDADOS NA APLICAÇÃO DA LEI

Para não incorrer em erros na aplicação da legislação nas rotinas trabalhistas, sugerimos adotar um procedimento aparentemente simples, mas que pode facilitar consideravelmente o trabalho dos empregados responsáveis pela operação.

Por meio de um grupo de pessoas da área de Recursos Humanos ou de uma única pessoa que possa coletar informações com as demais, crie um procedimento de atualização de informações, tais como:
  1. Especificar todos os cargos que possam ter legislação própria como advogados, médicos, estagiários e etc., que possam ter situações diferentes em relação à jornada de trabalho, salário, período de gozo de férias, adicionais, entre outras;
  2. Especificar a jornada de trabalho padrão da empresa (categoria predominante) e todas as demais jornadas diferenciadas, exercidas por profissionais de categorias diferenciadas;
  3. Especificar todos os acordos coletivos de trabalho e seus respectivos termos, listando as especificações ou garantias estendidas além da legislação padrão;
  4. Consultar a Convenção Coletiva de trabalho da categoria profissional predominante e especificar cada garantia ali estabelecida, tais como:
  • Adicional de horas extras superior ao percentual de 50% (cinquenta por cento) garantido pela Constituição Federal;
  • Adicional noturno superior ao percentual de 20% (vinte por cento) garantido pela CLT;
  • Adicional de insalubridade e periculosidade para profissionais específicos;
  • Prazo do contrato de experiência inferior ao estabelecido pela legislação;
  • Adicional de horas extras do domingo e feriado diferenciado;
  • Obrigatoriedade no fornecimento de vale-refeição, cesta básica, vale alimentação e etc.;
  • Piso salarial mínimo da categoria profissional e seus aumentos gradativos por força de tempo de serviço;
  • Outras garantias peculiares da respectiva categoria profissional;
  1. Consultar a convenção coletiva de trabalho de outras categorias que possam estabelecer garantias além das previstas na lei e da própria convenção coletiva da categoria predominante;
  2. Especificar situações indefinidas ou controversas que dependem de definição Jurídica ou do empregador como o pagamento de adicional de insalubridade ou periculosidade que dependa de laudo pericial ou que esteja por definição da Justiça do Trabalho/Ministério do Trabalho;
  3. Especificar (por meio de benchmarking) outras empresas do mesmo ramo de atividade ou equivalente que adotam a aplicação de legislação diversa a determinado cargo ou atividade;
  4. Especificar outras situações que achar relevante para se evitar passivos trabalhistas;

Exemplo

Empresa contrata empregado pelo período de experiência de 45 (quarenta e cinco) dias, renovados por mais 45 (quarenta e cinco) dias, conforme estabelece o § único do art. 445  e art. 451 da CLT.

A convenção coletiva de trabalho da categoria profissional estabelece que o contrato de experiência não poderá exceder a 60 (sessenta) dias.

Por não observar a cláusula convencional, ultrapassando os 60 (sessenta) dias previstos na convenção, o contrato de experiência deste empregado se tornará por tempo indeterminado, ainda que a formalização do mesmo tenha sido de 90 (noventa) dias.

Caso a empresa decida desligá-lo ao final dos 90 (noventa) dias, terá que arcar com o aviso prévio indenizado e todas as demais verbas rescisórias que este instituto prevê.

Para maiores esclarecimentos, acesse o tópico Contrato de Experiência.

Base legal: CF/88;
Art. 461 e art. 611 da CLT e os citados no texto;

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