CONTROLE DIFUSO: FIM DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL É DECLARADA INCONSTITUCIONAL

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 12ª REGIÃO 1ª VARA DO TRABALHO DE LAGES ACP 0001183-34.2017.5.12.0007 AUTOR: SIND.DOS AUXILIARES EM ADM.ESCOLAR DA REG.SERRANA RÉU: SOCIEDADE EDUCACIONAL SANTO EXPEDITO LTDA - EPP Vistos, etc. O SINDICATO DOS AUXILIARES EM ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR DA REGIÃO SERRANA - SAAERS ajuíza ação civil pública em face de SOCIEDADE EDUCACIONAL SANTO EXPEDITO LTDA. - EPP, em que requer a concessão de tutela de urgência de natureza antecipada para que seja determinado que a demandada emita a guia e providencie o efetivo recolhimento "em favor da entidade Autora (respeitado o percentual de 60% - art. 589 da CLT), decorrente do desconto de um dia de trabalho de todos os trabalhadores a contar do mês de março/2018, independentemente de autorização prévia e expressa, assim como seja feito também para os trabalhadores admitidos após o mês de março, nos termos do art. 602 da CLT, devendo ser praticados tais atos para parcelas vencidas e vincendas (nos termos do 323 do CPC, por ocasião de novos admitidos e também nos meses de março dos anos vindouros), bom base nos arts. 294 e 300 e seguintes do CPC". Os autos vieram conclusos para que seja proferida decisão. É o relatório. DECIDO. A contribuição sindical, anteriormente denominada de imposto sindical, existente no ordenamento jurídico brasileiro desde os anos de 1940, tendo sido, portanto, instituída na Era de Getúlio Vargas, tem por fim garantir meios econômicos e financeiros de subsidiar o sistema sindical brasileiro. A Lei Ordinária nº 13.467/2017, chamada de Reforma Trabalhista, pretendeu alterar, substancialmente, o sistema sindical brasileiro e uma dessas alterações está na contribuição sindical. Os artigos 545, 578, 579, 582, 583, 587 e 602 (Título V da Consolidação das Leis do Trabalho), no que concerne a tal instituto, foram modificados, com o fim de tornar meramente facultativa a contribuição sindical obrigatória (antigo imposto sindical), instituída pela Consolidação das Leis do Trabalho em 1943. . O objeto da presente ação civil pública é a facultatividade da contribuição sindical, quanto à constitucionalidade e a legalidade das alterações promovidas pela Lei Ordinária nº 13.467/2017. A contribuição sindical tem natureza parafiscal, sendo, portanto, tributo. Trata-se de questão já decidida pelos Tribunais brasileiros, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal, com fundamento na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conforme arestos a seguir transcritos: "MANDADO DE SEGURANÇA - TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO - CONTROLE - ENTIDADES SINDICAIS - AUTONOMIA - AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO. A atividade de controle do Tribunal de Contas da União sobre a atuação das entidades sindicais não representa violação à respectiva autonomia assegurada na Lei Maior. MANDADO DE SEGURANÇA - TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO - FISCALIZAÇÃO RESPONSÁVEIS - CONTRIBUIÇÕES SINDICAIS - NATUREZA TRIBUTÁRIA - RECEITA PÚBLICA. As contribuições sindicais compulsórias possuem natureza tributária, constituindo receita pública, estando os responsáveis sujeitos à competência fiscalizatória do Tribunal de Contas da União." (MS 28465, publicado em 03/04/2014, Relator Ministro Marco Aurélio). "Sindicato: contribuição sindical da categoria: recepção. A recepção pela ordem constitucional vigente da contribuição sindical compulsória, prevista no art. 578 CLT e exigível de todos os integrantes da categoria, independentemente de sua filiação ao sindicato resulta do art. 8º, IV, in fine, da Constituição; não obsta à recepção a proclamação, no caput do art. 8º, do princípio da liberdade sindical, que há de ser compreendido a partir dos termos em que a Lei Fundamental a positivou, nos quais a unicidade (art. 8º, II) e a própria contribuição sindical de natureza tributária (art. 8º, IV) - marcas características do modelo corporativista resistente -, dão a medida da sua relatividade (cf. MI 144, Pertence, RTJ 147/868, 874); nem impede a recepção questionada a falta da lei complementar prevista no art. 146, III, CF, à qual alude o art. 149, à vista do disposto no art. 34, §§ 3º e 4º, das Disposições Transitórias (cf. RE 146733, Moreira Alves, RTJ 146/684, 694)." (RE 180745, publicado em 08.05.1998, Relator Ministro Sepúlveda Pertence). "AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. NATUREZA JURÍDICA DE TRIBUTO. COMPULSORIEDADE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO." (RE496456, publicado em 21/08/2009, Relatora Ministra Carmem Lúcia). "RECURSO DE REVISTA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL. PRESCRIÇÃO APLICÁVEL ARTIGO 174 DO CTN. A contribuição sindical, instituída pelo artigo 578 da CLT, detém natureza tributária e parafiscal (art. 149 da CF). Em sendo assim, o prazo de prescrição incidente na espécie deve ser o estipulado no artigo 174 do CTN, que dispõe que para a ação de cobrança do crédito tributário o prazo prescricional será de 5 (cinco) anos. Logo, intacto o disposto no artigo 7.º, XXIX, da Constituição Federal, já que a prescrição incidente não é a trabalhista. [...]". (RR 33300-28.2008.5.03.0045, Quarta Turma, DEJT 13/05/2011. Relatora Ministra Maria de Assis Calsing) "TRIBUTÁRIO. RECURSOS ORDINÁRIOS EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL CONFEDERATIVA. CONTRIBUIÇÃO SINDICAL COMPULSÓRIA. DIFERENÇAS. INCIDÊNCIA DESSA ÚLTIMA PARA TODOS OS TRABALHADORES DE DETERMINADA CATEGORIA INDEPENDENTEMENTE DE FILIAÇÃO SINDICAL E DA CONDIÇÃO DE SERVIDOR PÚBLICO CELETISTA OU ESTATUTÁRIO.1. A Carta Constitucional de 1988 trouxe, em seu art. 8º, IV, a previsão para a criação de duas contribuições sindicais distintas, a contribuição para o custeio do sistema confederativo (contribuição confederativa) e a contribuição prevista em lei (contribuição compulsória). 2. A contribuição confederativa é fixada mediante assembleia geral da associação profissional ou sindical e, na conformidade da jurisprudência do STF, tem caráter compulsório apenas para os filiados da entidade, não sendo tributo. Para essa contribuição aplica-se a Súmula n. 666/STF: "A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo". 3. Já a contribuição compulsória é fixada mediante lei por exigência constitucional e, por possuir natureza tributária parafiscal respaldada no art. 149, da CF/88, é compulsória. Sua previsão legal está nos artigos 578 e ss. da CLT, que estabelece: a sua denominação ("imposto sindical"), a sua sujeição passiva ("é devida por todos aqueles que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal representada por entidade associativa"), a sua sujeição ativa ("em favor do sindicato representativo da mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, em favor da federação correspondente à mesma categoria econômica ou profissional") e demais critérios da hipótese de incidência.4. O caso concreto versa sobre a contribuição compulsória ("imposto sindical" ou "contribuição prevista em lei") e não sobre a contribuição confederativa. Sendo assim, há que ser reconhecida a sujeição passiva de todos aqueles que participarem de uma determinada categoria econômica ou profissional, ou de uma profissão liberal representada por entidade associativa, ainda que servidores públicos e ainda que não filiados a entidade sindical. 5. Recursos ordinários providos para conceder o mandado de segurança a fim de determinar que a autoridade impetrada proceda ao desconto anual da contribuição sindical compulsória." (RMS 38416 SP 2012/0126246-5, Segunda Turma, DJe 04/09/2013, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques) Como registro de entendimento jurisprudencial de destaque, tem-se a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 126 - DF, em que se pretendia discutir da compulsoriedade da contribuição sindical em face da liberdade sindical insculpida na Constituição da República Federativa do Brasil, constando da ementa do acórdão, cujo Relator foi o Ministro Celso de Mello, a natureza tributária da contribuição, conforme se tem a seguir transcrito: "AUSÊNCIA, NO CASO, DE QUALQUER INCERTEZA OU DE INSEGURANÇA NO PLANO JURÍDICO, NOTADAMENTE PORQUE JÁ RECONHECIDA, PELO STF, MEDIANTE INÚMEROS JULGAMENTOS JÁ PROFERIDOS EM FACE DA CONSTITUIÇÃO DE 1988, A PLENA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA CONTRIBUIÇÃO SINDICAL, QUE SE QUALIFICA COMO MODALIDADE DE TRIBUTO EXPRESSAMENTE PREVISTA NO PRÓPRIO TEXTO DA LEI FUNDAMENTAL." ADFP nº 126 - DF, DJe 22.02.2013, Relator Ministro Celo de Mello. Cabe destacar, por oportuno, que a natureza jurídica tributária da contribuição sindical deve-se ao fato de que parte dela - dez por cento - é revertida para os cofres da União, sendo dirigida para a Conta Especial Emprego e Salário (art. 589, inciso II, letra e, da CLT). Inegável, portanto, a natureza jurídica de tributo da contribuição sindical. Dessa forma, a tal instituto aplicam-se o disposto nos arts. 146 e 149 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. O art. 146 assim estabelece: " Cabe à lei complementar: [...] III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; [...]". Já o art. 149 dispõe: "Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionaisou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo." Assim, qualquer alteração que fosse feita no instituto da contribuição sindical deveria ter sido feita por Lei Complementar e não pela Lei nº 13.467/2017, que é Lei Ordinária. Existe, portanto, vício constitucional formal, de origem, impondo-se a declaração da inconstitucionalidade de todas as alterações promovidas pela Lei Ordinária nº 13.467/2017 no instituto da contribuição sindical. A Lei Ordinária nº 13.467/2017 não poderia ter alterado o instituto da contribuição sindical, por não ser Lei Complementar. Dessa forma, não poderia ter tornado a contribuição sindical facultativa. Além disso, a Lei Ordinária nº 13.467/2017 não poderia ter tornado o instituto da contribuição sindical facultativo, porque infringe o disposto no art. 3º do Código Tributário Nacional, que estabelece que o tributo "é toda prestação pecuniária compulsória". O Código Tributário Nacional é Lei Complementar. Lei Ordinária não pode alterar o conteúdo de Lei Complementar. Presente, portanto, a ilegalidade da Lei Ordinária nº 13.467/2017, infringindo o sistema de hierarquia das normas do Estado Democrático de Direito. Neste aspecto, está presente a probabilidade do direito, como requisito para a concessão de tutela de urgência. A ineficácia do provimento final está presente no fato de que a alteração que se pretendeu fazer no sistema da contribuição sindical pela Lei Ordinária nº 13.467/2017 compromete sobremaneira a fonte de renda da entidade sindical, parte autora, podendo prejudicar a sua manutenção e, por conseguinte, o seu mister constitucional de defesa da categoria. Assim, em face da inconstitucionalidade acima demonstrada, não pode a parte autora aguardar o trânsito em julgado da decisão definitiva para ter o seu direito assegurado, sob pena que a demora natural do curso do processo comprometa a sua manutenção como entidade que tem o dever de defender o trabalhador. A respeito da interferência da alteração da contribuição sindical no sistema de custeio sindical, Maurício Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado, na obra A Reforma Trabalhista no Brasil, com comentários à Lei nº 13.467/2017, p. 238, afirmam que "com a mudança específica que realizou, atingindo em cheio a contribuição sindical obrigatória - que existe há cerca de oito décadas na ordem jurídica do País -, sem dúvida provocará alteração muito substancial na estrutura do sindicalismo brasileiro, pois afetará, cirurgicamente, o seu fluxo de recursos econômico-financeiros; em síntese, afetará, substancialmente, o custeio das entidades sindicais". É importante registrar o Juízo que não se trata de ser a favor ou contra a contribuição sindical ou à representação sindical dos empregados, ou, ainda, de estar de acordo ou não com o sistema sindical brasileiro tal como existe atualmente. Trata-se, sim, de questão de inconstitucionalidade, de ilegalidade da Lei e de segurança jurídica. Isso porque a Lei nº 13.467/2017 promoveu a alteração da contribuição sindical de forma inconstitucional e ilegal. Tivessem sido observados o sistema constitucional brasileiro e a correta técnica legislativa, nenhuma inconstitucionalidade ou ilegalidade haveria. Assim, trata-se de questão que vai muito além da simples concordância ou oposição com a cobrança da contribuição sindical compulsória, pois é concernente, na verdade, à supremancia constitucional. Cabe ao Poder Judiciário declarar a inconstitucionalidade da Lei quando assim o entender e é o que este Juízo faz nesta decisão, com o fim de resguardar o cumprimento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Hoje, a discussão é sobre a contribuição sindical, de interesse primeiro e direto dos sindicatos. Amanhã, a inconstitucionalidade pode atingir o interesse seu, cidadão, e você pretenderá do Poder Judiciário que a Carta Magna seja salvaguardada e o seu direito, por conseguinte, também. Está, neste ponto, o motivo pelo qual o Poder Judiciário aparece, neste momento político crítico de nosso País, como o guardião da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, pela declaração difusa da inconstitucionalidade. Ante o exposto, acolho a tutela de urgência de natureza antecipada requerida pela parte autora, SINDICATO DOS AUXILIARES EM ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR DA REGIÃO SERRANA - SAAERS, para determinar que o réu, SOCIEDADE EDUCACIONAL SANTO EXPEDITO LTDA. - EPP, emita a guia e providencie o efetivo recolhimento em favor da entidade autora, respeitado o percentual de 60% (art. 589, inciso II, da CLT), do desconto de um dia de trabalho de todos os trabalhadores a contar do mês de março de 2018 e dos anos subsequentes, independentemente de autorização prévia e expressa, bem como para proceda da mesma forma quanto aos trabalhadores admitidos após o mês de março de 2018 e dos anos subsequentes, nos termos do art. 602 da CLT, por ocasião de novos admitidos, independentemente de autorização prévia. Cite-se o réu, para apresentar defesa, quando deverá juntar aos autos a relação de empregados informada ao CAGED. Intime-se a autora, que terá o prazo de quinze dias para manifestação após a apresentação da defesa, do que será intimada. Após, intime-se o Ministério Público do Trabalho, para emissão de parecer na forma que entender de direito. Por fim, venham conclusos os autos para que seja proferida sentença. Lages, SC, 03 de dezembro de 2017. PATRÍCIA PEREIRA DE SANT'ANNA Juíza Titular da 1ª Vara do Trabalho de Lages LAGES, 3 de Dezembro de 2017 PATRICIA PEREIRA DE SANTANNA Juiz(a) do Trabalho Titular.

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